Fabrico de Medicamentos falsos não dá prisão
Qualquer pessoa pode fabricar medicamentos falsos em Portugal, sem que por isso vá presa, a menos que se prove que o consumo desse fármaco teve consequências graves para a saúde, e isso é difícil, reconhece o Infarmed.
Se um comprimido, em vez de ter aspirina, tiver cianeto, é um problema e um risco enorme, mas não é suficiente dizer que pode matar, para criminalizar o fabricante. É necessário haver uma consequência para a saúde e conseguir provar a causa/efeito”, exemplificou o vice-presidente do Infarmed, para ilustrar a dificuldade em penalizar os falsificadores de medicamentos.Em entrevista à Agência Lusa, Hélder Mota Filipe afirmou que a legislação portuguesa, à semelhança da de outros países, dificulta a criminalização de quem faz contrafacção de medicamentos, um negócio muito mais rentável do que o tráfico de droga.
“É muito difícil provar esse risco, a não ser que morra alguém ou que fique altamente debilitado, e mesmo assim é preciso provar que não há inequivocamente dúvida nenhuma de que aquela situação resulta só e apenas da utilização do medicamento. Tudo o resto é difícil de criminalizar”, afirmou.
Esta é uma situação que a autoridade do medicamento prevê que mude dentro de dois ou três anos, para quando está prevista a alteração da lei que irá permitir a criminalização da falsificação de medicamentos, que hoje em dia está apenas na esfera da violação da propriedade intelectual.
Portugal assinou em Outubro do ano passado, com outros 12 Estados Membros, uma convenção que criminaliza todos os actos ligados à contrafacção.
“Agora entramos no processo legal de transposição, mas foi um passo importante de que nos orgulhamos bastante, de Portugal ter sido um dos primeiros subscritores da convenção”, afirmou.
Com a nova lei, todos os intervenientes no processo passam a ser criminalizados, desde o falsificador, ao fabricante das embalagens. Fica de fora o consumidor, a menos que se prove que é um interessado no próprio negócio.
Hélder Mota Filipe reconhece, no entanto, que é “difícil chegar aos contrafactores”, se não houver colaboração houver entre as autoridades. E sublinha a importância da parceria entre a polícia, as alfândegas e a autoridade dos medicamentos, que têm conseguido “casos paradigmáticos” de desmantelamento de redes complexas.
“É importante haver uma rede de autoridades montada, porque os contrafactores têm mecanismos de tentar ultrapassar os aspectos legais. O medicamento segue por um conjunto de países, pelo mundo todo, para lavagem da imagem. O dinheiro passa por outro mecanismo diferente. É difícil identificar estas vias”, afirmou.
Quanto à localização das fábricas de contrafacção de medicamentos, “não há países sem risco”, pois qualquer sítio pode ter a sua fábrica.
No entanto, são os países menos regulados do ponto de vista do medicamento, da justiça ou das alfândegas os mais facilmente utilizados para fabrico destes produtos.
“Uma pessoa pode sentir segurança porque um produto veio de Inglaterra, mas esta é só a localização final. Provavelmente passou por outros países e chegou a Inglaterra para dar mais seriedade”, explicou, adiantando que a experiência mostra que a maior parte dos medicamentos falsificados tem origem no Extremo Oriente, muitos deles na China.
Estas fábricas são locais que não garantem boas práticas de fabrico. Nenhum contrafactor gasta milhões de euros para fazer contrafacção, porque é uma prática ilegal e que tem que de ser lucrativa, explicou, sublinhando que “as condições são sempre as piores possíveis, desde que consigam um produto final com um aspecto convincente”.
“Uma imagem que tenho [de uma dessas fábricas] é uma daquelas máquinas à manivela de fazer cimento, que servia de misturadora para dar a cor aos comprimidos. Punham-se comprimidos contrafeitos lá dentro com o corante e dava-se à manivela”, contou.
Diário Digital/Lusa
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