Carolina Pérez, 35 anos, convive com fibromialgia e uma dor crônica do tipo neuropático desde os 11, quando sofreu um acidente de esqui em que fraturou o cóccix. Já enfrentou dez cirurgias e tem dois dispositivos neuroestimuladores implantados nas costas. Usava medicação à base de morfina, teve depressão e temia se tornar dependente da substância, que lhe provocava fortes efeitos colaterais.
Paciente da unidade de dor no hospital La Paz, em Madri (Espanha), Carolina conta que começou a fazer uso terapêutico de maconha há cinco anos. Ela compra a erva em um dos clubes da maconha que se proliferam pelo país.
“Eu nunca havia sido consumidora prévia, maconha não chamava a minha atenção. Mas queria deixar de tomar morfina, porque me fazia muito mal”, explica à BBC Brasil. “A maconha me ajuda fisicamente a descansar, a ter um bom sono e mais apetite, e desde o ponto de vista emocional, reduz minha ansiedade.”
Ao usar maconha medicinal, ela diz que sente menos dor por alguns dias, mas a erva não faz com que a dor desapareça. Por isso, avalia que é importante trabalhar a mente e o corpo, ter hábitos mais saudáveis.
Hoje ela é coordenadora do gabinete terapêutico da Federação Madrilena de Associações Canábicas (Madfac, na sigla em espanhol) e é ativista pela regulamentação dos clubes da maconha, que atualmente funcionam em vácuos jurídicos na Espanha.
‘Desobediência civil’
O gabinete terapêutico foi criado para facilitar o acesso à maconha medicinal. “Não significa que vamos procurando casos, pelo contrário. Muitos doentes crônicos fazem uso do cânhamo para se sentir melhor”, conta.
O gabinete terapêutico foi criado para facilitar o acesso à maconha medicinal. “Não significa que vamos procurando casos, pelo contrário. Muitos doentes crônicos fazem uso do cânhamo para se sentir melhor”, conta.
É proibido fumar nesse espaço, no qual os pacientes somente se informam sobre uso terapêutico, recebem assessoria de equipe médica e psicológica e podem fazer massagem ou musicoterapia. Para ter acesso, é preciso indicação médica.
Em apenas dois meses de funcionamento, o gabinete atende cerca de 250 pacientes. “Estamos funcionando por desobediência civil, pois o assunto não está regulado, e cada vez mais pessoas nos buscam pedindo ajuda e informação”, explica Carolina.
Os pacientes não adquirem maconha sozinhos, mas sim através da associação, que faz a compra para os cerca de 400 sócios.
Diferente de Catalunha, na comunidade de Madri as penas por cultivo são mais rígidas. “Madri é mais conservadora”, comenta, sugerindo que a compra coletiva é feita no mercado negro.
Carolina classifica como “urgente e humanitária” a regulação dos clubes canábicos. “Se já estão comprovados os benefícios, como doente que sou, não entendo porque não se regulou ainda.”
Ao todo, 250 mil usuários de maconha estão registrados na federação. Desses, 10% consomem a erva com fins terapêuticos.
O uso medicinal é o que recebe maior apoio social até mesmo dos que se mostram contra os clubes da maconha (como a Secretaria de Interior da Catalunha, que afirmou à BBC Brasil que não elaborará nenhuma norma que facilite o consumo da substância, “exceto para uso terapêutico”).
Feira do cânhamo
Ao mesmo tempo, representantes das entidades de autoconsumo de maconha há anos se mobilizam pela regulação dos clubes.
Ao mesmo tempo, representantes das entidades de autoconsumo de maconha há anos se mobilizam pela regulação dos clubes.
Em março passado, o tema foi amplamente discutido durante a 11ª Spannabis, a maior feira do cânhamo e de tecnologias alternativas do mundo, que este ano reuniu 33 mil pessoas em Cornellà, na província de Barcelona.
Com caráter lúdico e informativo, o espaço foi palco de debates internacionais, sob as perspectivas jurídica e social. O destaque foi para a recente legalização no Uruguai e no Colorado, Estados Unidos, e o referendo na Flórida.
Além disso, a feira teve 1,8 mil profissionais de 500 empresas do setor, que apresentaram as múltiplas utilidades do cânhamo, por exemplo, na construção civil, na culinária e como terapia para doentes crônicos.
Terra