Atos contínuos de violação de túmulos, danos e até profanação aos mortos estão revoltando familiares de pessoas sepultadas no Cemitério Público de Quixadá, o qual recebe o nome de Nossa Senhora do Carmo. No início desta semana, mais três deles foram "atacados".
A administração do cemitério registrou queixa na Delegacia Regional de Polícia Civil. No Boletim de Ocorrência (B.O.) consta quebra de vidraças, furtos de molduras e, inclusive, incêndio de um dos túmulo. Os crimes já começaram a ser investigados pela Polícia Civil.
O diretor administrativo do Departamento Municipal de Administração de Bens e Serviços Públicos (DMASP), Gledson Carneiro, foi quem procurou a Polícia para denunciar os casos. De acordo com ele, há cerca de três meses, um homem foi visto danificando alguns túmulos. Ele também avalia a possibilidade de tratar-se de vingança.
Há cerca de 20 dias, vasos e imagens de um jazigo foram quebrados. Dessa vez, o mesmo sepulcro foi incendiado. Segundo Gledson Carneiro, o vigia avistou as chamas de longe e chamou o coveiro. Utilizaram baldes para apagar o fogo. Apesar do esforço dos dois funcionários, os cadáveres viraram cinzas, para a tristeza dos familiares dos mortos.
Os restos mortais eram de dois tios, uma tia, dois primos, uma cunhada, do avô e do pai da comerciante Aldeniza Gomes de Holanda. Ela passou mal ao se deparar com a tumba da família chamuscada. "Foi uma ação proposital, de gente desocupada", diz a comerciante.
Para incendiar os caixões com os corpos foi necessário quebrar o tampo de mármore. O malfeitor utilizou gasolina para atear fogo. Todavia, ela não acredita na hipótese de vingança, pois, segundo afirma, ninguém da família dela tem inimigos. "Meu pai estava ali há seis meses. O desejo dele era ser sepultado, e não cremado. Se quisesse ser lembrado dessa forma seria atendido", desabafou.Mistério
As outras famílias também não entendem por qual motivo as imagens de louça, de lembrança de seus mortos estão sendo quebradas. Não possuem molduras de metais mais valiosos, como o bronze, que custa, em média, a R$ 9,00 o quilo no ferro-velho. Os "santinhos" simplesmente são destruídos. Os pedaços são deixados nos túmulos, revoltando ainda mais as famílias quando chegam para as visitas.
Furos e marcas nos jazigos com o numeral 55 tornam os atos ainda mais intrigantes. Conforme frequentadores do cemitério, os pertences e restos mortais podem estar sendo subtraídos para utilização em rituais de magia negra.
Esses mistérios estão assustando até quem precisa passar pelas próximo ao lugar. Alguns moradores do São João, um bairro da periferia de Quixadá, estão procurando outro caminho. Embora a área seja iluminada, poucos ousam passar e muito menos entrar no local quando anoitece, pois têm medo de assombrações e de se depararem com ladrões e malfeitores. As famílias dizem que não há vigilância no local. Os muros baixos facilita a ação dos vândalos."Despachos"
Responsável pela manutenção do Cemitério Nossa Senhora do Carmo, o coveiro José Lucimar Lima, mais conhecido por Babá, concorda em parte com as famílias. Somente com a elevação do muro de contorno do parque santo e instalação de cerca será possível evitar as invasões.
Atualmente, o portão é fechado quando anoitece, mas não há como impedir a entrada de intrusos. Babá não sabe qual o objetivo do desrespeito aos mortos. Entretanto, vez por outra encontra "despachos" na entrada do cemitério.
Acerca dos problemas no cemitério, diretor do DMASP, Nilson dos Santos, informou haver um servidor municipal para vigiar aquela área. Segundo ele, em 2010, a Prefeitura Municipal de Quixadá instalou iluminação no Nossa Senhora do Carmo para evitar a ação dos malfeitores.
Antes, de acordo com Nilson dos Santos, casais praticavam sexo e viciados consumiam drogas nos fundos do terreno, atrás dos túmulos maiores. Pelo jeito, nem a iluminação intimida essas pessoas, que continuam causando preocupando a população. "Agora, o caso é de polícia mesmo", destaca ele.FIQUE POR DENTRO
O que o Código Penal fala sobre esse tipo de ação
O Código Penal Brasileiro (CPB) pune o ato de vilipendiar, isto é, aviltar, profanar, desrespeitar, ultrajar o cadáver ou ter atitude idêntica em relação a suas cinzas no caso de incineração ou combustão. Está previsto no Artigo 212, que diz respeito aos crimes contra o sentimento religioso e contra o respeito aos mortos.
A pena é de detenção, de um a três anos, e multa. Trata-se de uma Ação Pública incondicionada. Conforme a doutrina, o vilipêndio deve ser praticado sobre ou junto do cadáver, na presença do corpo inerte ou de suas cinzas. Há entendimento de que o esqueleto possa ser objeto de vilipêndio. Neste crime, o esqueleto também será objeto material.
Entretanto, segundo a doutrina, não configura o crime o ato do (a) amante desesperado e cheio de dor que corta mechas do cabelo ou arranca parte das vestes da (o) amada (o)que faleceu para guardá-las como lembrança. Neste caso, não existe desrespeito, aviltamento, ultraje. Mas, pelo contrário, a atitude pode ser considerada como devoção, de acordo com o CPB.
Crisanto Dias Teixeira – Historiador – Jornalista e Radialista