A busca da harmonia entre as atividades econômicas e a preservação dos recursos naturais demanda ações bastante abrangentes, exigindo uma ampla ação cooperativa multidisciplinar. Isso mostra o quanto o homem sertanejo encontra saídas para o convívio com a seca. Mesmo em situações adversas, agricultores deixaram para trás a enxada e as sementes e deram início a outro meio de vida.
Pai e filho estão dando exemplos de criatividade no Município de Itatira. A criação de abelhas sem ferrão. A primeira colheita de mel de Jandaíra na localidade de Arisco - São José, a cinco quilômetros da sede de Itatira, é como um " trabalho de parto". Até o pote ficar cheio, zelo extremo com a higiene e cria. Os criadores chegam a ouvir e conversar com as abelhas. A produção de mel, além dos benefícios para a saúde e ao meio ambiente, está transformando a vida de agricultores familiares da região serrana. Francisco Sousa Loiola, de 62 anos, e Milton Carlos Cabral Loiola, de 36 anos, estão entre os maiores criadores de abelhas nativas, abelhas sem ferrão ou indígenas do Estado do Ceará.
Numa área protegida por alpendres cobertos com telhas, estão instaladas 81 colmeias de Jandaíra, três de Cupira e uma de Tuíba, abelhas que vivem em regiões protegidas dos ataques do homem e da degradação ambiental. Para se ter uma ideia da preservação dos criadores de Arisco, é que os cortiços são feitos de troncos de árvores perdidos no meio da caatinga e reaproveitados para moradas das abelhas nativas. "São pedaços de madeira tirados do meio ambiente e transformados em espaços para abrigar as Jandaíras", frisa Milton Carlos.
Segundo Francisco Sousa, quando o inverno é bom dá para se colher entre um e dois litros de mel de Jandaíra por ano. "Com essa seca, uma das maiores da história do Nordeste, iremos produzir em torno de um litro e meio por cada colmeia. É um negócio rentável. Cada litro custa hoje R$ 100,00", explica. A previsão é de produção de 100 litros de mel.
O filho, Milton Carlos, diz que a criação das abelhas nativas mudou o seu conceito em relação ao meio ambiente. "Antes eu não tinha muito interesse por esse negócio de preservar a natureza. Hoje vejo outra realidade e o que é mais importante, consigo repassar para meus amigos a importância desse processo para a preservação das espécies", frisa.
Além da Jandaíra, Milton Carlos cria três colmeias de Cupira, que produz dois litros de mel por ano a preço de R$ 25,00 e uma Tuíba, que garante um litro e meio ano do produto que custa R$ 30,00. "Toda a nossa produção já está encomendada para a Capital cearense. Vendemos para empresários da região do Centro de Abastecimento da Ceasa", diz.
Outro que cria Jandaíra é João Batista dos Santos, de 46 anos, conhecido em Itatira por Sidoca e que mora há 819 metros acima do nível do mar. Há dois anos entrou no ramo e já conta com dez colmeias, chamados também de cortiços. "É um negócio em expansão e multiplicação. De um enxame estou fazendo dois". De acordo com o produtor, quando a flora é boa a produção chega de 1 a 2 litros - ano. "Nossa região é rica em marmeleiro, retirina, flor do feijão, cabeça branco, arapiraca, grinalda, entre outros, as plantas que auxiliam na fabricação do mel".
"Tudo que estiver pronto para comercialização será levado em julho para a Expoece em Fortaleza. O produto é muito apreciado na Capital, por ser um mel diferenciado e medicinal", diz. Para Sidoca, criar abelhas é mais rentável do que criar galinhas, os custos são mínimos e não exige muito cuidados, porque a Jandaíra é nativa do campo e ajuda a preservar o meio ambiente.
A extinção dessas espécies causaria um problema ecológico, uma vez que são responsáveis, dependendo do bioma, pela polinização de 80 a 90% das plantas nativas no Brasil.
Mais informações
Rua: 25 de março - 1060
Bairro do Conjunto, Itatira
(88) 8124.6724
Assentamento Santa Terezinha
Itatira - Ceará
Projeto trabalha na preservação de abelhas
Itatira. Conscientes do problema, os técnicos Domingos Sávio, da Emartece de Canindé, e Aníbal Moreira, do Instituto Agropolos do Ceará, trabalham um projeto de preservação e expansão da abelha Jandaíra, nos Sertões de Canindé. Domingos Sávio lembra que o Governo brasileiro, por meio do Conselho Nacional do Meio Ambiente, publicou no Diário Oficial da União, em 17 de agosto de 2004, resolução nº 346 de 06 de julho de 2004, que disciplina a utilização de abelhas silvestres nativas bem como a implementação do meliponário. Para ele, que todas as quartas-feiras visita a região de Itatira para prestar assistência aos criadores de Jandaíra, sabe-se que somente a criação de uma legislação normativa não é suficiente para preservação de espécies da fauna e flora nativa. "É necessário também um programa informativo visando a capacitação e sensibilização, para que os produtores não só sejam conscientizados, mas também sejam capazes de mobilizar e informar aos seus vizinhos sobre os problemas", explica.
O litro do mel de Jandaíra custa R$ 100,00, pela sua raridade na produção. A previsão dos produtores é chegar ao patamar de 100 litros de mel neste ano
"Precisamos criar mecanismos para evitarmos a retirada indiscriminada dessas abelhas da mata. A criação dos meliponídeos deve ser realizada com responsabilidade para evitar a extinção das abelhas e a médio e longo prazo, a extinção desse importante agente polinizador", alerta Domingos Sávio.
Dóceis
"A criação de abelhas sem ferrão tem baixo custo e manejo fácil. Como as espécies são dóceis, não é necessário o uso de roupas e equipamentos de proteção para lidar com elas. Outra vantagem é que a atividade pode ser realizada até em áreas urbanas, como o quintal de uma residência, convivendo com pessoas e animais domésticos, desde que haja vegetação na vizinhança". Essas espécies vivem em colônias compostas por muitas operárias, que são as responsáveis pela construção e manutenção das colmeias, e por uma rainha geradora de ovos, que dão origem a novas abelhas. Os ninhos em geral, são instalados em troncos e galhos de árvores, mas também podem ser encontrados em mourões de cerca, alicerces de construção, cupinzeiros e locais subterrâneos, como formigueiros. Com ou sem ferrão, as abelhas têm uma função importante na natureza. São polinizadoras de plantas, permitindo a floração e a produção de sementes e frutos.
As abelhas são fundamentais para a manutenção da vegetação natural e cultivada, pois, pela polinização e consequente produção de frutos e sementes, contribuem para a perpetuação de muitas espécies nativas e de culturas agrícolas. São importantes formadores de renda para as populações rurais e peri-urbanas, pois aumentam e melhoram a produção de frutos, além de possibilitar a comercialização de mel, própolis, pólen e das próprias colônias.
Extinção
No entanto, apesar desse papel como elemento fundamental à sustentabilidade das áreas com vegetação natural, a maioria da população desconhece a existência e a importância das abelhas nativas. E para salvar as abelhas indígenas, o que fazer? Segundo pesquisadores do tema, serão necessárias algumas ações primordiais como: que cada criador brasileiro, com consciência ecológica, crie 60 colônias de uma única espécie de abelha sem ferrão de sua região, para evitar a endogamia; que este processo seja iniciado com as espécies de Melipona de cada região, as mais atacadas por meleiros e as que estão mais próximas da extinção.
Com informação do Diário do Nordeste - Regional - Antônio Carlos.