Pesquisa observou alterações psicológicas do agricultor, como ansiedade e perdas cognitivas
Para os coordenadores do projeto, a pesquisa pode indicar políticas públicas para melhorar a qualidade de vida do sertanejo (Foto: Honório Barbosa) |
O relatório está em fase de conclusão, pela empresa MGov, que obteve financiamento da Fundação Bill & Melinda Gates para realização da pesquisa, entre os meses de fevereiro a junho deste ano. Nesse período, foram aplicados questionários e realizou-se, inclusive, teste de Quociente de Inteligência (QI), por meio de plataforma celular. "O resultado aponta para a importância das políticas de convivência com o Semiárido", observa um dos coordenadores do trabalho, Rafael Vivolo.
Políticas
Para os coordenadores do projeto, a pesquisa é uma ferramenta que pode indicar políticas públicas para melhorar a qualidade de vida da população sertaneja e solucionar problemas recorrentes. Segundo informou a MGov, o trabalho no Ceará contou com o apoio da Secretaria de Desenvolvimento Agrário (SDA), da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Ceará (Ematerce) e da Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (Funceme).
O Ceará vivencia um grave período de seca desde 2012. O cenário para 2016 é de continuidade do quadro de estiagem, que pode chegar ao quinto ano consecutivo e ser um dos piores dos últimos 100 anos. A maior parte dos municípios do Estado registrou perda elevada de safra, superior a 50%, segundo dados da Ematerce.
A pesquisa testou se uma parcela dos agricultores cadastrados no Garantia Safra era capaz de mitigar as consequências psicológicas da preocupação com a seca. "O resultado, no entanto, foi negativo", observa Rafael Vivolo. "Programas de pagamento de seguros, por meio de índice, como o Garantia Safra, sofrem com problemas de confiança do produtor no mundo todo. Há dificuldade de acompanhar o que determina o desembolso, e uma vez que fica definido que Município vai ser atendido, a ansiedade do produtor aumenta até que ele receba os recursos", completa.
Fronteira
Os organizadores do projeto afirmam que o trabalho está na fronteira do que se está fazendo no mundo no sentido de avaliação de políticas e desenvolvimento de soluções que possam, de fato, apoiar as necessidades dos mais pobres. O relatório observa que a maior preocupação com a seca se traduz em pior desempenho nos testes de atenção, memória e controle de impulsividade. Essas variáveis são comumente usadas em Psicologia Cognitiva como medidas de QI.
"O efeito é brutal: a perda de desempenho nesses testes entre os produtores mais preocupados com a seca é equivalente a retroceder do Ensino Médio para o Ensino Fundamental", frisou o analista Guilherme Lichand. "Essa preocupação não prejudica o QI da mesma forma em todas as dimensões", salientou.
Os testes cognitivos realizados por telefone foram validados por pesquisa no campo, com o apoio de alunos de campi do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE), em dez cidades do Interior. "Os resultados nesses testes são compatíveis com aqueles obtidos por meio da metodologia das chamadas automáticas de voz", esclareceu Lichand. "Em 2015, graças ao apoio da SDA e da Ematerce, acompanhamos esses mais de 2.800 produtores, mês a mês, no que diz respeito às suas decisões produtivas. Semanalmente, entre março e maio, alguns produtores foram monitorados por meio de SMS, para identificar sua previsão para os próximos 30 dias de chuva no seu Município".
Confiável
A pesquisa deste ano documentou que o agricultor familiar do sertão cearense considera a Funceme a fonte mais confiável de previsão sobre a quadra chuvosa. O órgão apoiou a pesquisa na busca por aperfeiçoar a comunicação com o usuário final da informação climática.
"O nosso interesse é saber como nossa informação chega ao produtor rural e qual a tomada de decisão dele sobre o plantio", disse o presidente da Funceme, Eduardo Sávio Martins. "Há institutos que fazem previsão para grandes áreas, em uma escala maior, com divulgação na TV, sem distinção da realidade local", explicou.
O presidente da Funceme ainda não recebeu o relatório da pesquisa e observou que o objetivo de apoiar o trabalho é obter dados sobre a comunicação da empresa e a compreensão por parte do agricultor. "Se houver necessidade, vamos rever a política de comunicação", disse. "Os produtores rurais precisam entender claramente as nossas previsões, por meio dos índices divulgados".
O tema da estiagem ganha cada vez mais importância no Ceará depois de quatro anos consecutivos de seca e a possibilidade de o fenômeno meteorológico se repetir no próximo ano, afetando a vida dos moradores do sertão.
Perdas seguidas de safra de grãos, das culturas de subsistências, a escassez de água, descapitalização e a falta de perspectiva criam um cenário desolador para quem vive no campo. "Os jovens perdem o interesse em permanecer no campo, sem estímulo, e os idosos ficam sem condições de reagir", observa o agrônomo Paulo Maciel.
A pesquisa tenta entender o real impacto da estiagem entre os agricultores familiares e fornecer subsídios aos gestores públicos para que possam aplicar e aperfeiçoar as políticas de convivência com os efeitos da seca. Afinal, esse é um dos ciclos mais extensos da interrupção da quadra chuvosa, que vem secando açudes e desafiando o governo para oferecer novas fontes de abastecimento.
A SDA não quis comentar o resultado preliminar da pesquisa e divulgou nota esclarecendo informando que a Ematerce e a SDA ainda não tiveram acesso ao trabalho realizado, à metodologia, questionário, amostra de entrevistados e relatório final com os resultados do estudo.
Mais informações
MGov - São Paulo
Telefone: (11) 5041-5707
www.mgovbrasil.com.br
Secretaria de Desenvolvimento Agrário (SDA) - Telefone: (85) 3101-8105
Honório Barbosa - Colaborador / Diário do Nordeste